sábado, 25 de outubro de 2008

A encantadora de pássaros


Lá para as 8 da manhã de todo dia santo, aparecia ela, velhinha, com um sorriso, com a humildade e a bondade estampada em cada pedaço de sua carga histórica , com seu vasinho de alpiste, que começava a atira-los á rua, e como num passe de mágica, surgiam dezenas de pássaros em sua frente. Então a boa senhora simplesmente encostava-se à parede de sua casa e ficava admirando os pássaros, enaltecendo a sua importância em estar todos os dias a beira de sua casa, cantando e enchendo o seu dia de amor e paz. E como que para retribuir, os pássaros ficavam voando ao seu redor, cantalorando os seus mais belos cantos, fazendo grandes exibições em conjunto e pousavam novamente, deliciando mais um pouco da comida oferecida pela boa senhora.
O ocorrido se dava lá pro final da Rua Macarani, lugar sossegado, de gente humilde que viveu por muitos anos na roça, tendo aquele velho e bom costume sertanejo de contato e agradecimento para a natureza, de respeito mútuo. Se você não entendeu muito bem do que eu estou falando, não se preocupe, é coisa que não se vê mais hoje em dia.
Mas esse detalhe é relevante em nossa história.
Acontece que certo dia, quando já se dava o horário da boa senhora aparecer, os pássaros começaram a sobrevoar sua casinha, fazendo mais um dos seus espetáculos. Porém o que se sucedeu foi que o tempo passou e a velhinha não apareceu aquele dia.
Todos discutiram, e pensaram que ela simplesmente não pode ir naquele dia.
Daí se aconteceu mais dois dias seguidos o ocorrido. Assim uma rolinha, que se dizia o vivido, e entendido da vida fez a seguinte observação: “Ela deve ter se tornado igual aos outros humanos. Ela deve ter esquecido de sua mãe”. E todos como que por submissão aceitaram aquele fato. Somente um, entre os mais de 30 pássaros que ali estavam reunidos, o pardalzinho jovem e sonhador, não aceitou de forma alguma que aquela boa e velha senhora tinha esquecido da essência. Ele sabia que tinha alguma coisa errada naquele fato.
Daí ele chamou imediatamente sua amiguinha pardalzinha. Eram eles companheiros de infância. Sempre pela manhã, iam rodear a casinha verde da esquina, cantalorando cada dia com uma emoção maior do que a do dia anterior. E a boa senhora abria a janela, admirando e agradecendo-os pela canção. Já se passavam três dias também que ela não abria a janela.
Intrigados e determinados a descobrir o que estava a se acontecer, planejaram uma entrada na casa. Ficaram esperando até que a porta se abrisse para entrarem o mais rápido possível. Daí 30 mim a porta se abriu, e como que um raio que despeja toda sua energia de uma vez, foram eles porta adentro. Nem sequer foram percebidos na entrada. Por rodearam muito a casa conheciam bem onde era o quarto da boa senhora, e sem mais delongas se dirigiram para lá.
Chegando lá, tiveram um grande susto. Estava a boa senhora deitada na cama, com os olhos fechados, “deve estar apenas dormindo”, com o braço como que largado de lado e muito coberta. Ficaram a tentar entender a conversa dos humanos, e conseguiram escutar que havia uma doença, que a estava a deixando desta forma. Da forma que eles não gostavam de ver. Não existia naquela boa senhora aquele sorriso encantador, daqueles que envolvem a alma toda num único ato. Não exista aquela expressão de tranqüilidade e paz.
O pequeno pardalzinho disse que tinha escutando do seu avó sobre uma certa folha da mata que curava humanos, e chamou a pardalzinha para ir atrás desta folha.
Percorreram grandes distâncias para conseguir achar um pequeno lugar que ainda existia um pouco da mata nativa que ainda permanecia mantendo viva a folha da cura. Acharam à folha e imediatamente correram para que a velha mastigasse-a.
Fizeram a mesma estratégia, que mais uma vez deu certo. Ao entrar no quarto foram em total silencia jogar a folha na boa da boa senhora. E quando eles já estavam a colocar a folha na boa, abriram-se em sua frente aqueles belos e risonhos olhos que ele tanto admirava nas suas manhãs. Ela como que entendesse o que se estava passando, começou a mastigar a folha, engoliu-a, olhou para os dois jovens pardaizinhos, e os presenteou com o mais belo sorriso já emanado naquelas redondezas.
Saíram eles então a cantalorar, a assobiar e a rodopiar na casa inteira, emanando naquela casa, que até então estava sobrecarregada de uma tristeza assustadora, a mais romântica das alegrias.No dia seguinte lá estavam os dois a cantar para a boa senhora, esperando que ela os presenteasse com seu sorriso e sua presença. Sucederam-se alguns minutos até que a janela se abrisse mais uma vez, para que o ar ficasse novamente cheio da harmonia entre aquele canto, e aquela alma cheia de amor, aquele sorriso inteiro.

Um comentário:

Unknown disse...
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